quarta-feira, 30 de maio de 2012

- Ela está comendo o que eu fiz - Dizia para si, como se ainda não soubesse que era ela quem tinha pedido, outra vez, o "Risotto Vermelho". Foi numa segunda-feira em que tomei o corredor para ir ao banheiro e vi Nilson sentado de costas para mim e a chefe, mulher magra de olhos fugitivos, quando me viu passar ergueu a voz dizendo qualquer coisa como "Além de tudo quer ganhar mais?" resumindo sua reunião com o empregado que, ao perceber que aqueles olhinhos fundos desviaram dele para trás dele, virava a cabeça para ver quem ouvira o seu vergonhoso ultimato, a grande, e no fundo já esperada, negativa. Lembro das sombrancelhas de Nilson e da grande pena que senti dele naquele dia. O boné nas mãos e os seus olhos e me pedindo a misericordia do fingimento. Trágicamente silencioso o escutei empilhar a cadeira em que estava sentado e logo após posso jurar ter escutado uma risada nasal da senhora dos olhinhos de vidro.
Outro dia o encontrei sozinho na cozinha, dançando como nunca havia visto, pouco antes da fatidica segunda-feira, sempre o via com um "Bom dia" serissimo na sua cara marcada pelas espinhas em baixo do boné, ombros e braços tão largos que pareciam que iriam despencar de tão pesados, articulação de lenhador, um tipo que só dança quando está tão distraido que já não sabe como se comporta normalmente. Mas nesse dia ele dançava e o surpreendi, nos olhamos como se olham dois acusados. Uma dança primitiva, consistia basicamente em mover os joelhos e dobrar os cotovelos, a esperança triunfando sobre seu corpo, distração incontrolavel. Primeiro planejava um grande porre de ser carregado como um grande boxeador que vence a luta aos cacos, comemoraria o aumento do salário transbordando os bolsos para que o costume da pobreza não se perdesse. Depois lhe escorria um fio de esperança do aumento alcançar para se mudar do quarto de pensão, onde morava com João e João os moços da limpeza que carregavam este cargo apenas na carteira de trabalho, e creio que foi neste pensamento que dançou de euforia esperançosa, era sabado e tudo parecia possível - O outro cozinheiro vai sair de férias, não tem como ela dizer não! - diziam para ele, uma lógica inexistente lhe parecia tão obvia - se ela não quiser, voce ameaça sair!. Disse bom dia e ele piscando seus olhos com força retribuiu em silencio meio abobalhado e apático. As vezes piscava os olhos com tanta força que parecia alguma tentativa de suicidio infantil, querendo fechar os olhos e nunca mais abri-los, outras vezes lançava o pescoço para frente como um cão tomando água da vasilha e também ajeitava seu avental, que já estava no lugar, como se possuisse uma barriga postiça que estivesse caindo. Em dias de muito calor fazia os seus tres cacoetes juntos e eu curiosamente olhava em volta para perceber que era o único a reparar nas repetiçoes de Nilson.
- Olha, a morena alí no canto - Me cutucou com o cutuvelo e com dois dedos abria as palhetas da persiana da janela redonda no meio da porta vai e vem. Olhando para fora, via o cotidiano de uma burguesa paulista, comendo seu risoto de 68 reais acompanhado de uma taça de água Perrier Separados por uma porta estavam Nilson e a morena que todas as quartas-feiras, por volta das 3, pedia o mesmo prato. A história do monstro que espreita a mocinha se repetia. Parado alí ao lado de Nilson o senti humano e triste. Qualquer homem que não recebe amor se torna aquele moleque ranzinza da escola que é o primeiro a ter pelos nas canelas e os esconde, um por um. Nilson era o moleque sombrio que envelheceu e agora me estimava pois eu não tinha contado à todos que falhara no exato momento em que deveria abrir o para-quedas e dizer "Então eu me demito!". Ficou à olhar para fora do "submarino" por mais algum tempo, deixando-se dançar com os peixes, pois não olhava mais para ela, olhava para o centro do salão onde ele estava pousado, bailando com as juntas junto de sua morena. Nilson finalizou, de costas para a porta e o mundo, dizendo para sua imaginação, censurando-a como quem pisa em flores - Gostosa, né?

terça-feira, 22 de maio de 2012

Eh meu pai, olha teu filho

eu mais a minha mulher, vamo fazer um ranchinho todo feito de sapé. Minha mae, eu vou pra lua e seja o que deus quiser.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Foi exatamente as duas horas

Como o dever da água que encontra escorredouro, o sol deslizou pela janela no alto da cozinha, entrando em um feixe denso e compensado. Banhou meu rosto que se movia como pendulo na inquietação dos desnutridos. Brotando do buço e testa gotas vivas do mais puro frio, tremendo sobre pisos antiderrapantes aperto meus olhos e vejo a denúncia de tantas partículas que existem e nem vemos, mas no sol surgem bailando sempre para o alto, feito fumaça de restos de todos. Nesse momento inequívoco e rastejante, onde nenhum segundo é suficientemente grande para uma vida nem pequeno demais para a criação do sol, que a saudades bateu a pino.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

terça-feira, 8 de maio de 2012

Olerite

Praguejo, impesso, tremo de boca cheia de lagrima
Aperto, encurto, miro rosto para-peito.
Seduzo, empurro, palpebra da mão e palma do olho.
Respiro, assino, mil e cem reais pelo mes todinho.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Afundo no vão entre teu pescoço e o colchão, berço do calor que expande esse amor arbitrário, e o resto me parece minimo e gasto.